segunda-feira, 28 de junho de 2010

Diamantina 07/06/2010

Quando você percorre um dos caminhos da Estrada Real, inevitavelmente você percorrerá pelo menos mais um dos caminhos. No meu caso, o segundo caminho foi o Caminho dos Diamantes, que se inicia na cidade de Diamantina e termina em Ouro Preto. Eu digo que se inicia em Diamantina, levando em consideração o sentido que a riqueza dos diamantes tomava, eram garimpados na região de Diamantina e seguiam para Ouro Preto, a capital da província das Minas Gerais, para depois seguirem para a Europa. Deve-se considerar também que toda a marcação dos totens privilegia esse sentido, de Diamantina a Ouro Preto.

Decidi percorrer o Caminho dos Diamantes em uma viagem solo. Não queria aborrecer nenhum companheiro com a minha lentidão.

Uma viagem solo implica uma logística diferenciada, você deverá procurar ser o mais autônomo possível, procurando prever os cenários mais diversos e perigos que em uma viagem em grupo são minimizados.

Por outro lado, uma viagem solo tem algo de mágico, um chamado para aventura que lhe cutuca a mente, o risco e o desejo de sentir-se só em um mundo tão cheio.

Como costuma dizer o caminhante e escritor Flávio Leão, “sozinho, porém, não desacompanhado”, Deus está sempre com aquele que viaja só. Essa viagem começa na bela Diamantina.



Catedral de Santo Antônio da Sé, em meio a tantas igrejas antigas, a catedral que é da década de 30 do século XX se destaca imponente no centro da cidade.
Casarão típico de Diamantina onde hoje funciona um Banco.

O movimentado centro histórico da cidade.


Uma vista do passadiço da Glória.


Entardecer nas ruas do que um dia foi o arraial do Tijuco. No final dessa rua está a casa que pertenceu a Chica da Silva.

Vista parcial da cidade de Diamantina com a serra do cruzeiro ao fundo.
Ao cliclar nas fotos elas serão ampliadas.

No dia 06 de junho embalei a bicicleta com plástico-bolha, papelão e lona. Então parti para Diamantina de ônibus. Usei o dia seguinte para fazer turismo na cidade, como era uma segunda-feira museus e igrejas estavam fechados à visitação. Mas a cidade, à exemplo de Ouro Preto, é um museu a céu aberto. Quem está fazendo a Estrada Real, acaba ficando meio obcecado por caminhos e um destaque em Diamantina é o caminho dos Escravos, um calçamento de pedra que foi utilizado nos séculos XVIII e XIX para o transporte de cargas. Até hoje é possível fazer o caminho que vai até o distrito de Medanha.

Vista do Caminho dos escravos, uma obra do século XVIII bem próximo à cidade de Diamantina.


O Caminho dos Escravos ainda liga a cidade de Diamantina ao povoado de Medanha e é possível fazê-lo à pé.


Montando a Bike dentro do quarto do hotel.
Primeiro marco do Caminho dos Diamantes ainda dentro da cidade de Diamantina.

Se eu soubesse que esse caminho deixaria tanta saudade, teria-o feito mais lentamente.

"Às margens de um pequeno afluente do rio Grande, os povoados se fixaram dando origem ao arraial do Tijuco, que significa barro na língua indígena. A ocupação seguiu o curso do rio onde eram feitas as minerações."
Inscrição de uma placa em um totem que sinaliza o caminho à margem desse rio.

De Diamantina ao Serro 08/06/2010.

A Pedalada começou no dia 08 de junho de 2010, já se aproximava das 08:00 horas quando encontrei o primeiro marco da ER. Depois de atravessar um bairro carente na periferia da cidade, a beleza natural se mostrou deslumbrante. Rochas calcárias brotando em meio às serras verdejantes cortadas por uma estrada colorida. Parece uma criação de Burle Marx com Lewis Carroll.

Depois de passar pelas povoações do Vau, São Gonçalo do Rio das Pedras, Milho Verde e Três Barras cheguei à cidade do Serro de 21 mil habitantes e milhares de belos lugares. Foram 69,7 km rodados nesse dia.

Nesse trecho passa-se por uma ponte sobre o rio Jequitinhonha que corre fino por entre piscinas de pedras.

Antes de São Gonçalo do Rio das Pedras logo depois da ponte, pelejei com uma serra de mais de 3 km, um aclive íngreme que me fez caminhante quando queria ser “pedalante”. (não tirei fotos, estava muito cansado pra isso).

Nota, São Gonçalo é um daqueles lugares em que dá vontade de ficar uns dias, tem a bela igreja Matriz e a pequena igreja do Rosário e algumas casas com muros de pedras feitos por escravos.




Um antiga casa solitária, lembra que é muito bom ser solitário às vezes.



Qual cicloturista não ficaria boquiaberto num caminho desse?

...ando só
pois só eu sei
pra onde ir
por onde andei
ando só
nem sei por que
não me pergunte
o que eu não sei

pergunte ao pó

desça o porão
siga aquele carro
ou as pegadas que eu deixei
pergunte ao pó
por onde andei
há um mapa dos meus passos
nos pedaços que eu deixei...

Engenheiros do Hawaii!!!!



Uma estrada recoberta de quartzo. Logo no início lembramos que estamos no Caminho dos Diamantes.



A diversidade de cores do terreno chama a atenção do viajante.



Fala sério, parece que o Burle Marx andou por aqui.


Depois de um dos trechos mais difíceis do Caminho dos Diamantes, não dá para não parar em um lugar desse.


Igreja do distrito de São Gonçalo do Rio das Pedras

Ponte sobre o rio Jequitinhonha na divisa entre os municípios de Diamantina e Serro.

Do Serro a Conceição do Mato Dentro 09/06/2010

Serro é uma bela cidade setecentista com casario colonial preservado e de grande valor arquitetônico. Conta atualmente com cerca de 22 mil habitantes. Uma das imagens mais conhecidas da cidade do Serro é a capela de Santa Rita de 1745, com sua escadaria que liga a capela à Praça João Pinheiro.

Mas a cidade guarda ainda belíssimas construções como a chácara do Barão do Serro, a Casa do Barão de Diamantina, o Museu Coeli, a igreja Nossa Senhora do Carmo e mais uma lista enorme de atrações, sem citar a grande quantidade de cachoeiras que existe na região.

Na cidade do Serro, encontrei o aventureiro e escritor francês Jaques Sirat que já deu a volta ao mundo de bicicleta e já percorreu diversos caminhos a pé mundo a fora. Atualmente ele está caminhando em uma viagem solo de Diamantina a Paraty, viagem que possivelmente resultará em mais um livro.

Depois de Serro vem uma sucessão de belos povoados, como Alvorada de Minas, Itapanhoacanga onde fui almoçar depois de subir uma serra acentuada de 1,5 km e descer por uma distância semelhante. Itapanhoacanga fica em um vale, possui restaurantes e pousada.

Optei por sair da Estrada Real e deixei de passar pelos povoados de Tapera e Córregos (que prometi conhecer depois) e segui pela MG 010 até a cidade de Conceição do Mato Dentro. Apesar de não ser feia ou ruim de rodar, tenho certeza que a beleza natural da outra estrada é maior.

Vista parcial da cidade do Serro a partir da Igreja de Santa Rita.




O escritor e aventureiro Jaques Sirat e eu. Ele está perfazendo a Estrada Real de Diamantina a Paraty em uma caminhada solo.

Um close da Igreja de Santa Rita, construção estimada em 1745, rico interior com decoração do secúlo XIX.

A igreja de Santa Rita com sua escadaria longa, tão característica da cidade quanto o queijo do Serro.

Conceição do Mato Dentro 10/06/2010

Em Conceição do Mato Dentro eu pude fazer uma manutenção na bicicleta, regular o passador traseiro e fazer uma pausa de um dia. Aproveitei para conhecer a Cachoeira do tabuleiro com 273 m, a maior cachoeira de Minas Gerais e a terceira do Brasil. A cachoeira do Tabuleiro está distante 20 km de Conceição, localiza-se em um terreno muito acidentado. Optei em visitá-la de moto, contratei um moto-boy ao preço de R$ 25,00 e entrei no parque municipal pagando uma entrada de R$ 5,00.

Além da cachoeira do Tabuleiro, Conceição do Mato Dentro tem belas igrejas e um conjunto de casarões bem conservados.

Destaque para as igrejas de Santana de 1744, do Rosário concluída entre 1728 e 1730, Nossa Senhora da Conceição de 1722 e de Bom Jesus de Matozinhos em estilo eclético de construção recente, mas não menos interessante.

Igreja do Rosário em Conceição.



Capela de Santana reconstruída entre 1880 e 1886.


Eu poderia ficar horas contemplando esse espetáculo.

Cachoeira do tabuleiro nem o pequeno volume de água, comum em junho, diminui sua beleza.

Igreja de Bom Jesus de Matozinhos em Conceição do Mato Dentro, situada em local privilegiado, possui em seu interior vitrais belíssimos.

Antiga cadeia da cidade de Conceição do Mato Dentro.

De Conceição do Mato Dentro a Itambé do Mato Dentro11/06/2010

No dia 11 de junho, uma sexta-feira, pedalei os cerca de 60 km que separam as cidades de Conceição do Mato Dentro de Itambé do Mato Dentro. O percurso inicia com uma subida de cerca de 2,3 km pelo asfalto da MG-010 depois desse percurso no asfalto vira-se à esquerda e toma-se uma estrada de terra com acesso para a Serra do Cipó. A partir daí temos um trecho de belas paisagens até Morro do Pilar distante aproximados 27 km de Conceição.

Morro do Pilar é uma pequena cidade com cerca de 3.500 habitantes, a região é repleta de cachoeiras e a menos de 5 km da cidade está à entrada do Parque Nacional da Serra do Cipó.

Partindo de Morro do Pilar pedalei mais 34 km até Itambé do Mato Dentro, é um percurso desgastante, mas deslumbrante, boa parte do percurso é margeando os rios Preto de Cima e o do Peixe. Há subidas muito longas com cascalho solto e parte com areia fofa, o que dificultava a pedalada.

Dormi em Itambé depois de percorrer 65 km bem rodados, partes dele na Serra do Cipó.


Um pedaço do Caminho dos Diamantes próximo a Itambé do Mato Dentro.


Um trecho na região da serra do Cipó, próximo a Morro do Pilar.

Um abrigo a beira do caminho.

Antigas fazendas sustentam a magia de uma Minas Gerais centenária que cresceu com a atividade rural em conjunto com a mineração.

A bicicleta espera na beira da estrada enquanto eu aprecio a bela vista à beira de um rio.

                                            Trecho próximo a Itambé do Mato dentro.

Mulas e jumentos ainda são muito utilizados nessa parte de Minas Gerais, é bonito ver a ligação que este Estado rico e moderno ainda tem com suas raízes.

domingo, 27 de junho de 2010

De Itambé do Mato Dentro à Bom Jesus do Amparo 12/06/2010

No dia 12 de junho decidi que iria dormir no povoado de Cocais. Passei pelos povoados de Senhora do Carmo e Ipoema. Este último é um distrito de Itabira, terra de Carlos Drumond de Andrade. No povoado existe o museu do tropeiro, com rico acervo dos petrechos usados por aqueles caminhantes que percorreram a Estrada Real desde seus primórdios até boa parte do século XX. É interessante notar que a cultura tropeira ainda permanece acesa nos habitantes da região, pela estrada é muito comum ver moradores carregando sua produção e realizando trabalhos como coleta de lenha utilizando-se de jumentos e muares.


Trecho da Serra do Cipó, serras até onde a vista alcança.
Um mar de serras, trecho da Serra do Cipó.


Cavaleiro ruma para cocais em um uma bela manhã de sábado.

Trecho da Estrada Real próximo ao povoado de cocais.


Casarão do comerciante e minerador Fernando Toco.

Detalhe do museu do tropeiro localizado em Ipoema, distrito de Itabira.
Caminhos centenários pelo complexo de serras do Espinhaço.

Uma amistosa alameda convida o viajante a prosseguir pelo Caminho dos Diamantes.


O homem e o cavalo ainda são parceiros na lida diária em uma região que não deixa a cultura tropeira morrer.

As sombras me lembravam que o sol já ia se por.

Bom Jesus do Amparo a Santa Bárbara 13/06/2010

Saindo de Ipoema segui para Bom Jesus do Amparo. Ao atravessar a cidade vi o primeiro marco da Estrada Real naquele trecho, consultei a planilha e devido a uma falha na leitura dessa planilha pedalei por cerca de três km morro acima, não vendo o outro marco decidi voltar, orientar-me e enfim dormir naquela cidade. Aproveitei uma festa junina e jantei dois caldos por R$ 2,00 (isso é que é "viajar bem e barato".

No outro dia descobri que estivera no caminho certo, às 7:40 quando depois de subir a serra por 5 km pelo asfalto entrei à esquerda no sentido à Itabira e peguei uma bela estrada de terra batida até o povoado de Cocais, que dista cerca de 23 km de Bom Jesus. Nesse trecho o ciclista atravessa a BR 381 que recebeu a alcunha de “rodovia da Morte”, ainda bem que pedalei por ela somente alguns poucos metros até entrar de novo na estrada de terra.

Pouco antes de chegar a Cocais o viajante atravessa um eucaliptal que em dado momento se mescla com a mata natural proporcionando um ótimo passeio.
Cocais é um distrito de Barão de Cocais, vale conhecer a igreja de Santana e ver o casarão que foi de Fernando Toco, um minerador e comerciante que ficou rico depois de encontrar ouro na região. Na entrada da cidade também pode ser vista a fazenda estalagem construída no século XVII. Também pode ser visitado o museu com utensílios de Fernando Toco, com vários utensílios de mineração e do dia-a-dia de um trabalhador do século XVIII.

Na saída de Cocais está uma das jóias do Caminho dos Diamantes trata-se do sítio arqueológico da Pedra Pintada distante 3,5 km do povoado. Depois de uma subida íngreme deve-se sair da estrada principal e seguir pela direita, o caminho está bem sinalizado.

O sítio está localizado em uma região belíssima de onde se pode avistar todo um vale verdejante, que segundo um guia local, já foi adquirido por uma grande mineradora que cuidará da mudança do cenário.

O sítio arqueológico foi estudado em 1843 por Peter Lund, o mesmo que estudou a gruta de Maquiné. A sua exploração comercial e apresentação ao público é ainda muito recente segundo um dos proprietários do lugar que também é o guia do passeio.

As pinturas rupestres datam de um período compreendido entre 6.000 e 8.000 anos atrás. São três conjuntos principais de figuras muito bem preservadas, com motivos diversos entre eles antropomórficos e zoomórficos. Conhecer o sítio vale a viagem, sem falar que ali é possível degustar um vinho de jabuticaba com um sabor que nunca havia experimentado. Ali perto ainda há uma cachoeira que não tive tempo de visitar.


Sítio Arqueológico da Pedra Pintada, a 3,5 km de Cocais localiza-se esse importante registro pré-histórico.

Antes de Mestre Ataíde, mineiros de 6.000 anos atrás já faziam suas artes por estas bandas.

Um dos painéis de Pedra Pintada, uma riqueza arqueológica comparada às de Pedra Furada no Piauí.

Foto de autoria do Juliano, enquanto eu cuidava de fazer meus próprios registros.

Natália, Juliano e eu em visita ao sítio arqueológico da Pedra Pintada em Cocais.
Juliano percorreu o Caminho dos Diamantes em maio deste ano

Fachada do museu de Fernando Toco